Todo corpo feminino violado é um corpo escravizado que deve ser libertado!
 
Por Rikartiany Cardoso*
 
Via Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro – Alagoas
 
 
Nesta data, celebra-se o Dia Internacional da Não Violência contra a Mulher. Nessa lógica é que se torna urgente a destruição de todas as desigualdades de gênero, vista que, só haverá uma sociedade emancipada quando acabarem as estruturas do capitalismo patriarcal, que se desenvolvem com a dominação étnico-racial e de gênero da sociedade atual.
 
A propriedade do homem sobre a vida da mulher não remonta apenas aos tempos em que o feminicídio era legitimado por lei, como nos casos de defesa da “honra” do homem, mas sim no nascimento da família monogâmica resultante da divisão social do trabalho na produção de mercadorias,no princípio do capital, da propriedade privada e do Estado, como Engels externou em sua obra, A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, o início de uma forma de sociabilidade baseada na divisão de gênero, posteriormente em classes, o que, por lógica, coloca que anteriormente, um outro modo social,igualitário, existia e foi possível. A força de trabalho destas mulheres não só é explorada no capitalismo, como a divisão sexual do trabalho perpetua, também, a atividade doméstica como somente das mulheres, não sendo contabilizado como tal, as horas doadas a coletividade, e esta pode se apropriar dela por meio, também, da violência, como um mecanismo de dominação.
 
A violência, é a ruptura de qualquer integridade da vítima, seja ela física, moral, psíquica ou sexual , e é crucial para a continuidade do sistema capitalista , patriarcal, homofóbico e racista! Vejamos, a opressão da mulher pelo homem é necessária a perpetuação do sistema capitalista, ao passo em que é subordinada aos desejos e violências machistas, o ciclo patriarcal de controle e dominação aumenta. Neste segmento, na América Latina, isso é ainda mais latente por conta de todo o período de genocídio da população indígena e negra, sendo endossado pela cultura do estupro , presente desde a era colonial.
 
No Brasil, segundo dados do Datafolha, 503 mulheres foram vítimas de agressão física a cada hora no país, neste ano, sendo 4,4 milhões de brasileiras. Se contarmos as agressões verbais, o índice sobe em 29% , no ano passado. A pesquisa mostra que 9% das entrevistadas relatam ter levado chutes, empurrões ou batidas; 10% dizem ter sofrido ameaças de apanhar.Além disso, 22% afirmam ter recebido insultos e xingamentos ou terem sido alvo de humilhações (12 milhões) e 10% (5 milhões) ter sofrido ameaça de violência física. 40% das mulheres com mais de 16 anos sofreram assédio dos mais variados tipos em 2016: 20,4 milhões (36%) receberam comentários desrespeitosos ao andar na rua; 5,2 milhões de mulheres foram assediadas fisicamente em transporte público (10,4%) e 2,2 milhões foram agarradas ou beijadas sem o seu consentimento (5%). Adolescentes e jovens de 16 a 24 anos e mulheres negras são as principais vítimas. No transporte público a lógica vigente é a de que se existe tolerância/naturalização/minimização da denúncia em relação ao assédio, está tornar-se normal em qualquer espaço e rotineira. Assim, o corpo da mulher, antes claramente propriedade alheia e resguardado juridicamente assim, continua sendo considerado público, sendo passível de agressões.
 
De acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), a Central de Atendimento à Mulher registrou, no ano passado, 1.133.345 atendimentos. O número foi 51% superior ao de 2015 (749.024). Ainda sim,52% das mulheres que responderam já terem sido agredidas, não conseguiram fazer a denuncia, por medo e receio de todo o atendimento falho, onde rapidamente tornam-se rés.
O relatório regional do PNUD( Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) demonstra que dos 33 países de América Latina e Caribe, 24 contam com leis contra a violência doméstica, contudo, somente 9 deles sancionaram leis que tipificam uma variada gama de expressões de violência contra as mulheres.Também destaca que 16 países caracterizaram penalmente o feminicídio. Apesar dos governos adotarem medidas de combate a violência, os assédios, agressões e assassinatos continuam. A opressão é sistêmica e estrutural nossa sociedade. Apesar da criação de leis, nos limites e proposituras burguesas (como o feminicídio, por exemplo), estas aprimoram a mudança de costumes, mas não muda a cultura e principalmente, não muda a estrutura.
 
O que confirma que o cerne da violência é o sistema que oprime e violenta cotidianamente mulheres, principalmente as mulheres trabalhadoras, visto que não tem acesso ou possibilidade de continuidade em políticas públicas eficientes. Qual a causa então? A moral sexual é regida por regras econômicas, pois nesse sistema qualquer relação humana está subordinada a lei do valor, sendo a garantia da família nuclear burguesa, atendendo aos interesses da propriedade privada e do capitalismo, assim reformas na legislação propiciam proteção e garantismo mínimo aos direitos da mulher, mas não superam de modo completo a exploração no trabalho e violências perpetradas.
 
Neste sentido, o patriarcado moderno é estabelecido por meio de um contrato social e sexual, isto é, social no sentido de direito político de homens sobre mulheres e sexual no sentido de acesso sistemático dos homens nos corpos das mulheres. Assim, nosso feminismo é classista, visto que, por exemplo, o feminismo liberal transforma o privilégio masculino em algo individual, apenas remotamente vinculada a esquemas de exploração- dominação mais amplos, desconsiderando o sistema em que está inserido, o capitalismo, o que é um erro, pois o cerne dessa opressão é o controle, princípio presente em todos as áreas sociais. Sendo condição primordial e absoluta a análise e mudança a partir de nossa classe, pois a ideologia em que vivemos integra um elemento de alienação e coisificação da( o) outra(o).
 
Portanto, a emancipação da mulher e combate a violência de gênero está, portanto, intrinsecamente ligada à luta contra a sociedade capitalista. A luta pela emancipação da mulher é a luta pela emancipação do gênero humano. O feminismo classista luta pela libertação das mulheres mediante o fim da propriedade privada e da divisão sexual do trabalho. Não sendo possível emancipar verdadeiramente as mulheres sem derrubar o sistema capitalista que também é patriarcal.
 
Todas e todos às ruas para dizer NÃO a violência contra a mulher!
Nin una a menos!
Lutar, criar, poder popular!
SIM À VIDA DAS MULHERES!
 
*Estudante de Direito, militante do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro, da União da Juventude Comunista (UJC) e do Núcleo Jurídico Jayme Miranda da Unidade Classista.
 
FONTES:
 
ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. p. 198 e 199. Editora Civilização Brasileira. Rio de Janeiro. 1987.
 
IG São Paulo. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2017-08-07/violencia-contra-a-mulher.html> Acesso em 23/11/2017.
 
SAFFIOTI, H. I. B. O poder do macho. São Paulo: Moderna, 1987.
 
SAFFIOTI, H. I. B. Gênero, Patriarcado e Violência . São Paulo: Expressão Popular, 2015.
 
GOLDMAN, W. Mulher, Estado e Revolução: política familiar e vida social
soviéticas (1917-1936). São Paulo: Boitempo, 2014.
 
KOLLONTAI, A. A nova mulher e a moral sexual. Editora Expressão Popular: São
Paulo, 2011.
 
Justiça de saia. América Latina é a regiao mais violenta do mundo para as mulheres. Disponível em: <http://www.justicadesaia.com.br/america-latina-e-a-regiao-mais-violenta-do-mundo-para-mulheres-diz-onu/> Acesso em 24/11/2017.