No dia 27 de agosto de 2020 o país sofreu mais um retrocesso na luta pelo aborto seguro. O Ministério da Saúde, com características claramente conservadoras, publicou no Diário Oficial da União a Portaria n° 2.282/2020, que dificulta o acesso, já extremamente complicado e precário, de meninas e mulheres ao aborto legal em caso de gravidez decorrente de estupro.
A lei n° 13.931, de 10 de dezembro de 2019, exigia que os profissionais de saúde informassem à polícia sobre estupros (notificação compulsória), o que viola a confidencialidade entre médico e paciente. A Portaria 2282 regulamenta esta lei. De acordo com essa medida, os médicos deverão “preservar possíveis evidências materiais do crime de estupro a serem entregues imediatamente à autoridade policial, tais como fragmento de embrião ou feto com vistas à realização de confrontos genéticos que poderão levar a identificação do respectivo autor do crime”. Essa decisão foi tomada 2 semanas após uma menina de 10 anos passar por um aborto legal, depois de ter sido violentada pelo próprio tio, e representa a clara tendência bolsonarista do nosso governo em todas as esferas. A Portaria 2282 descumpre as bases da constituição de direito a liberdade, já que as vítimas não possuem o direito de decidir conforme sua vontade sobre a continuidade ou não da gestação, ficando refém de uma legislação conservadora. Ao dificultar o acesso ao aborto legal e seguro, tal decisão alimenta a cultura machista do estupro, bem como sujeita mais mulheres ao aborto clandestino, esse que já mata muitas diariamente. Além de romper com o sigilo médico, a decisão trata as vítimas de violência sexual como suspeitas e possíveis culpadas pelo abuso que sofreram e as afasta ainda mais da assistência médica hospitalar.
A partir desta portaria, novamente o Estado trata um problema grave de saúde pública como um caso apenas de viés jurídico e policial, reforçando o descaso com a vida das mulheres. Nós, do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro, viemos a público nos posicionar contra o fundamentalismo deste Estado fascista que, com esta medida, põe nossas vidas em risco, criminaliza as vítimas e dificulta o acesso aos serviços de saúde.

Via Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro Porto Alegre