Por Maria Carol – mestranda em Geografia na UFRRJ, militante do PCB e dirigente da UJC
…Há de existir alguém que lendo o que eu escrevo dirá… isto é mentira! Mas, as misérias são reais. …O que eu revolto é contra a ganancia dos homens que espremem uns aos outros como se espremesse uma laranja
Carolina Maria de Jesus
Publicado originalmente em Instuto Brasileiro de Direito Urbanístico
Se fosse possível desenhar o rosto do Brasil, não há dúvidas de que seria o de uma mulher preta, da resistência de uma maternidade coletiva das mães que criaram os filhos das outras, que choram nas periferias seu luto e guerreiam com a pobreza e a fome. Em meio a tantas que merecem todos os reconhecimentos possíveis, a figura de Carolina Maria de Jesus, rígida da resistência diária mas também do afeto que a humaniza enquanto mulher, será o foco deste texto.
Enquanto escreveu os desafios diários que atravessaram sua trajetória e não caíram no esquecimento, reafirmou não somente a necessidade da visibilidade que recebeu, mas reconheceu que cotidianamente existem e resistem inúmeras Carolinas no presente tomado pela pobreza urbana.
Nascer negro em nosso país significa estar destinado a condições de pobreza, violência e um longo histórico de direitos negados – muitas vezes até mesmo o de existir, que deveria ser inegociável. Ser mulher e preta é aprofundar ainda mais esse conjunto de opressões.
Os dados sistematizados em pesquisa no ano de 2018¹ apontam que as pessoas brancas são maioria nos empregos que requerem maior preparo, como médicos ou engenheiros, enquanto os pretos ocupam a maioria das vagas que exigem menor nível de qualificação, como operador de telemarketing, vigilante e cortador de cana-de-açúcar. A situação se aprofunda quando os cargos de gerência e chefia são analisados, onde menos de 5% é ocupado pela população preta, segundo o levantamento feito em 2020 em canais de oferta de vagas de emprego².
Dados como os apresentados acima demonstram o quanto ainda vigora uma divisão racial do trabalho e oportunidades de acesso aos estudos e à qualificação profissional. Evidentemente, resta para a população negra as piores condições. Esses e tantos outros dados levantados indicam a submissão da estrutura social aos pilares construídos a partir da escravidão e do extermínio. O racismo legitima a superexploração do trabalho de negras e negros dentro do sistema capitalista, assim como o preconceito e a segregação materializados na dinâmica social asseguram o conjunto da justificativa moral para essa tamanha exploração, se fazendo valer de argumentos pautados pela lógica meritocrática e individualista atual.
Essa condição de profunda marginalidade social que foi imposta à população negra não ficou restrita ao campo econômico: ela levou ao processo de condenação de sua existência. Isso se dá através da criminalização e demonização da cultura, da história, das figuras e distorce a própria autocompreensão do que é ser preto, além de construir um senso comum que contamina toda a sociedade, inclusive as próprias vítimas desse sistema.
Justamente por entender a dinâmica do racismo enquanto parte de toda a estrutura social, econômica e política que atua em nossa formação que não se pode olhar para as desigualdades de gênero de forma homogênea, como ressalta Lélia Gonzalez ao afirmar que “tratar, por exemplo, da divisão sexual do trabalho sem articulá-la com seu correspondente em nível racial é recair numa espécie de racionalismo universal abstrato, típico de um discurso masculinizado e branco” (GONZALEZ, 2011 p. 20).
Os dados, passados e recentes, escancaram as diferentes condições de vida ditadas pelo ritmo das opressões, e apesar das tímidas transformações e possíveis avanços, o lugar da mulher preta ainda é na base da pirâmide social e com raras possibilidades de transformação.
Carolina Maria de Jesus, a neta de escravizados e filha de lavadeira e operário, nascida na cidade de Sacramento (MG) em 14 de março de 1924, tem sua origem muito próxima aos bisavós e avós das gerações mais recentes. Sua obra é resultado direto de sua realidade, é uma denúncia implacável à grande máquina de moer sonhos e gente.
Com uma descendência direta de negros escravizados, é como se seu próprio nascimento ocorresse em condição já marginalizada, um destino previsível, não por alguma teoria de predestinação, mas por ter sido guiado pelas mãos invisíveis do mercado, que negocia a vida de milhares de brasileiros, sobretudo os racializados.
Em Quarto de Despejo (1960)³, destacado como sua maior obra, enquanto escreve num diário a autora grita ao mundo a sua vida enquanto mulher negra e favelada, única responsável pelo sustento e criação de seus filhos, realidade muito comum de diversas brasileiras. Segundo os dados do IPEA e do IBGE, 45% dos lares no Brasil são chefiados por mulheres, sendo mais da metade deles por mulheres negras que estão vivendo em condição de pobreza profunda(4).
A fuga dos interiores e o movimento de migração para as grandes cidades e capitais foram e seguem sendo táticas de muitas famílias, mas na maioria das vezes podem não acarretar na tão almejada melhoria significativa das condições de vida. Como bem relembra Carolina de Jesus, seja no ambiente rural ou nos grandes centros, somos escravos do custo de vida.
ESCRAVIZADAS PELO CUSTO DE VIDA
“Aniversário de minha filha Vera Eunice. Eu pretendia comprar um par de sapatos para ela. Mas o custo dos gêneros alimentícios nos impede a realização dos nossos desejos. Atualmente somos escravos do custo de vida. Eu achei um par de sapatos no lixo, lavei e remendei para ela calçar.” (JESUS, 2014, p. 93).
É tão difícil admitir que não superamos a pobreza e que certamente não se pode combatê-la isoladamente, sendo a miséria e a fome parte do sistema e o que o alimenta. E, atualmente, o clima é de retrocessos. A conta da crise mais uma vez está sendo compartilhada entre os mais pobres, que não usufruem sequer das migalhas dos altos rendimentos daqueles que não são afetados. Ao escancarar as contradições, pode-se notar que, apesar das décadas que nos separam, os relatos de Carolina de Jesus são vivenciados por muitas famílias.
“…Ontem eu ganhei metade de uma cabeça de porco no Frigorífico. Comemos a carne e guardei os ossos. E hoje puis os ossos para ferver. E com o caldo fiz as batatas. Os meus filhos estão sempre com fome. Quando eles passam muita fome eles não são exigentes no paladar.” (JESUS, 2014, p. 30).
A lógica do lucro acima de tudo e de todos legitima que um país como o Brasil, o famoso “celeiro do mundo”, tenha 33,1 milhões de brasileiros passando fome(5) e prefira ver sua população comendo ossos e peles em prol dos lucros de meia dúzia de burgueses.
“7 de janeiro … Hoje eu fiz arroz e feijão e fritei ovos. Que alegria! Ao escrever isto vão pensar que no Brasil não há o que comer. Nós temos. Só que os preços nos impossibilita de adquirir. Temos bacalhau nas vendas que ficam anos e anos a espera de compradores. As moscas sujam o bacalhau. Então o bacalhau apodrece e os atacadistas jogam no lixo, e jogam creolina para o pobre não catar e comer.” (JESUS, 2014, p. 151).
“A lentilha está a 100 cruzeiros o quilo. Um fato que alegrou-me imensamente. Eu dancei, cantei e pulei. E agradeci o rei dos juizes que é Deus. Foi em janeiro quando as aguas invadiu os armazens e estragou os alimentos. Bem feito. Em vez de vender barato, guarda esperando alta de preços: Vi os homens jogar sacos de arroz dentro do rio. Bacalhau, queijo, doces. Fiquei com inveja dos peixes que não trabalham e passam bem.” (JESUS, 2014, p.60).
Os relatos apresentados nos trechos acima não são uma novidade, mas sim uma realidade repetida em diferentes escalas, épocas e lugares. É uma constante de perversidades.
O aumento do custo de vida é um dos primeiros aspectos sentidos, a alta no preço dos alimentos, dos aluguéis, do transporte e das formas de suprir as necessidades mais básicas de sobrevivência que passam a ser encaradas como privilégio.
“Sai pensando na minha vida infausta. Já faz duas semanas que eu não lavo roupa por falta de sabão. As camas estão sujas que até dá nojo. Não fiquei revoltada com a observação do homem desconhecido referindo-se a minha sujeira. Creio que devo andar com um cartás nas costas: Se estou suja é porque não tenho sabão.” (JESUS, 2014, p.44)
Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), em março de 2022 o salário considerado o mínimo necessário para manter uma família de quatro pessoas deveria ser de R$6.394,76, ou seja 5,28 vezes o salário mínimo vigente, no valor de R$1.212,00.
A última síntese dos indicadores sociais apresentada pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística, em 2018, apresenta que 63% dos lares chefiados por mulheres negras no Brasil se mantêm abaixo da linha da pobreza, ou seja, vivem com renda mensal de aproximadamente R$420. Os dados pioram se comparadas as famílias chefiadas por mulheres que vivem com US$1,90 per capita por dia(6). As famílias chefiadas por mulheres negras representam 23,7%, enquanto as por mulheres brancas são 13,9%. Embora ambos os dados sejam absurdamente atrozes, eles revelam o contraste racial e a histórica perpetuação das mulheres negras enquanto o grupo social mais prejudicado no Brasil.
A Síntese dos Indicadores Sociais também avança nas análises e apresenta uma grande restrição de direitos considerados básicos. Os indicadores mostram que 41,8% dos domicílios chefiados por mulheres negras não possuem acesso a rede e tratamento de esgoto, água encanada e serviço de coleta de lixo.
A quantidade de famílias ou lares no Brasil que são sustentados e chefiados por mulheres é crescente. Ao final da década de 1990, a marca era de 23%, enquanto, em pesquisas mais recentes do IPEA, o número chega a atingir os 40% em 2015. O fato de um lar ser liderado por mulheres não é sinônimo de ausência da presença masculina: em 34% desses lares existe a presença do cônjuge.
O aumento veloz do valor da cesta básica é outro agravante: mais uma vez, os dados do DIEESE divulgados em abril de 2022 mostram que houve aumento em todas as capitais. Isso agravou ainda mais a situação daqueles que já encontravam enormes dificuldades para garantir o seu sustento e agora se aprofundam em casos de insegurança alimentar e de fome.
“Hoje amanheceu chovendo. E um dia simpático para mim. E o dia da Abolição. Dia que comemoramos a libertação dos escravos […] Continua chovendo. E eu tenho só feijão e sal. A chuva está forte. Mesmo assim, mandei os meninos para a escola. Estou escrevendo até passar a chuva, para eu ir lá no senhor Manuel vender os ferros. Com o dinheiro dos ferros vou comprar arroz e linguiça. A chuva passou um pouco. Vou sair.[…] Fui pedir um pouco de banha a Dona Alice. Ela deu-me a banha e arroz. Era 9 horas da noite quando comemos. E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravatura atual — a fome!“ (JESUS, 2014, p.30)
Não ter a certeza do que será comido no dia de amanhã não pode ser tratado apenas como um dado, um contraste social ou uma questão de saúde. Josué de Castro há mais de cinco décadas nos alertava sobre os efeitos mais profundos da fome.
“Consumindo sua carne, corroendo seus órgãos e abrindo feridas em sua pele, mas também age sobre seu espírito, sobre sua estrutura mental, sobre sua conduta moral. Nenhuma calamidade pode desagregar a personalidade humana tão profundamente e num sentido tão nocivo quanto a fome.” (CASTRO, 1967).
Dentre as várias violências aqui citadas, a fome recebe maior destaque pois ela impossibilita nossa existência. O fato de famílias pretas e pobres terem que decidir entre morar ou comer é a demonstração de que todos os nossos direitos foram arrancados. Num falso gesto de escolha o comer vence, mas nós perdemos!
A VIOLÊNCIA DO RACISMO É ESTRUTURAL
Ao contrário das insistentes afirmações daqueles que defendem o mito da democracia racial no Brasil, cunhado por Gilberto Freyre, a dominação econômica e a exploração do povo negro não acabaram com o fim legal da escravidão. Atualmente, sequer vivemos em plena democracia, quem dirá nos marcos raciais. Em todo o país é possível observar os enormes contrastes de classe, raça e gênero que ditam aquelas e aqueles que podem acessar o direito a moradia, alimentação, saúde, educação, lazer e emprego digno.
A abolição determinou a alteração da condição de negras e negros, outrora escravizados, para trabalhadores assalariados e com possibilidade de serem tratados como consumidores, aspecto primordial para lógica capitalista. No entanto, é fundamental apontar que essa transformação não se deu acompanhada de qualquer medida que pudesse garantir à população negra sua integração à sociedade. Supostamente “libertos” do regime escravocrata e deixados à sua própria sorte, sem direito à terra ou propriedade, oportunidade de emprego ou renda, os negros brasileiros passaram a compor aquilo que Clóvis Moura caracterizou como franja marginal(7).
Em primeiro lugar, só é possível compreender a situação na profundeza que ela exige se o ponto de partida for a perspectiva do racismo enquanto uma ideologia de dominação pautada na desumanização e responsável pela imposição de um conjunto de práticas que buscam assegurar a máxima legitimidade social para garantir a explorações do branco sobre o negro, assim como os demais povos compreendidos como não-brancos.
“Era, por isso mesmo, uma ciência eurocêntrica. Com a instalação e o dinamismo do sistema colonial e seu desdobramento imperialista, ela se estende ao resto do mundo e aí procura ter uma visão mais abrangente e sistemática, unindo todas as diferenças étnicas europeias em um bloco compacto – o branco –, que passa a se contrapor ao restante das populações não civilizadas, dependentes e racialmente diversas das matrizes daquele continente. Não se cogita mais nas diferenças entre o nórdico, o alpino, o mediterrâneo, que passam a ser, de modo genérico, componentes da raça branca. E essa raça tinha por questões de superioridade biológica o direito de tutelar os demais povos.” (MOURA, 1994, p. 4).
A lógica capitalista se apropria do legado colonial e escravista, utilizando-os como ferramenta imprescindível para sustentar e potencializar sua natureza exploratória. Isso resulta que, no interior do sistema capitalista, o Estado assume um papel contraditório. Ele “estabiliza a sociedade mantendo o processo de individualização e a separação de classe que caracterizam o capitalismo, mas que, ao mesmo tempo, atua para impedir que os antagonismos e os conflitos destruam a vida social”. (ALMEIDA, 2015, p.752).
E, assim, o próprio Estado cumpre o papel, não só de estabilizar a sociedade, mas também garantir que parte dela possa ser controlada, ainda que de modo fantasioso, para fugir do questionamento de suas contradições e perversidades. O fato mais contraditório está justamente na defesa de relação formalmente livre e igualitária entre indivíduos, enquanto a força de trabalho é considerada uma mercadoria de venda imposta.
Os níveis de exploração da mão de obra e a intensidade do controle através da força variam de acordo com elementos variados, dentre elas, e com enorme importância no seio dessa estrutura, está o racismo. Este aspecto reforça que os fatores que guiam a exploração da força de trabalho não podem ser reduzidos somente à esfera econômica, como mostram alguns estudos incompletos, pois simplesmente ignoram a importância da dimensão racial e de gênero da formação socioeconômica do Brasil.
Ao considerar o racismo enquanto o elemento estrutural e estruturante do sistema capitalista, identifica-se que seu papel é ainda mais profundo, pois contribui para o processo de esvaziamento da consciência de posição de cada um dos indivíduos no interior do sistema que os regula. É uma relação de controle – do corpo, da consciência e das práticas.
São justamente a estrutura e os mecanismos desse Estado burguês que garantem as condições necessárias para a reprodução da lógica de produção do sistema capitalista, em que seus diferentes níveis de exploração da mão de obra dos trabalhadores serão mediados pelas ideologias absorvidas pelo próprio capital (ALVES, 2022, p. 8). Sendo assim, é possível afirmar que o racismo e o machismo são responsáveis pela imposição de uma divisão racial e sexual de todo o trabalho, remunerado ou não, condenando a população negra, sobretudo as mulheres negras, a condições de trabalho informal, de risco, com menores remunerações e, sobretudo, da ausência de direitos.
Com toda a capacidade de controle, a lógica burguesa e racista de concepção de Estado prescreve o espaço daqueles que podem ou não ser lidos como descartáveis. É uma materialização do projeto conduzido pelas classes dominantes, em que aqueles que não são considerados aptos para sequer a venda da sua força de trabalho podem ser literalmente descartados de toda a estrutura social, inclusive das condições mais elementares para a sobrevivência.
“Como vemos se, de um lado, os negros egressos das senzalas não eram incorporados a esse proletariado nascente por automatismo, mas iriam compor a sua franja marginal, de outro, do ponto de vista ideológico, surgiam, já como componentes do comportamento da própria classe operária, os elementos ideológicos de barragem social apoiados no preconceito de cor. E esse racismo larvar passou a exercer um papel selecionador dentro do próprio proletariado. O negro e outras camadas não-brancas não foram, assim, incorporados a esse proletariado incipiente, mas foram compor a grande franja de marginalizados exigida pelo modelo do capitalismo dependente que substituiu o escravismo.” (MOURA, 1988, p. 65).
O racismo é peça fundamental na decisão de quais parcelas da sociedade estarão condenadas à situação de miséria ou fome, dos que vivem ou morrem. Por todos esses motivos aqui brevemente retomados, não se pode ignorar a denúncia contra o sistema que caminha junto da longa trajetória de luta dos negros, em especial das mulheres negras que chefiam suas famílias, na luta por condições mais humanas, pela superação da condição de pobreza e libertação do seu povo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Carolina de Jesus, sobretudo em sua obra Quarto de Despejo, ao trazer momentos da sua vida, deu voz para aquelas que a antecederam e sucederam. A moeda mudou e a cidade também, mas a luta das mulheres negras contra a pobreza, a fome e as injustiças materializada cotidianamente ainda é viva e muito necessária.
São vidas que já nascem marcadas pelo trauma do racismo estrutural. A fome, a falta de moradia segura e a favela como espaço da violência são aspectos que levam a morte a ser consequência repetidas vezes. A dor física causada pela falta do alimento e da enfermidade é somada à perturbação mental gerada pela preocupação de como construir saídas imediatas.
As experiências narradas por Carolina poderiam ser facilmente confundidas com um relato atual, em pleno 2022. O Brasil mudou bastante da década de 1950 até hoje, mas ainda sustenta similaridades cruéis: o retorno ao mapa da fome, a insegurança alimentar, a alta do desemprego e a inflação e tantos outros males com que lidamos dia após dia. Tudo isso atinge de forma mais dura as mulheres negras e seus lares.
É fundamental denunciar a gigantesca quantidade de direitos negados, da impossibilidade de mobilidade social, da existência digna em um meio onde insistem em defender a meritocracia individualista como régua das experiências de vida.
A luta das mulheres negras contra a condição de pobreza e o estigma que as acompanha é constante e não deve ser individualizada, mas sim encarada como um projeto coletivo e necessariamente alinhado com a luta pela superação desse sistema e todas as suas estruturas. Mais do que nunca, é preciso sobreviver, ou melhor, viver! É urgente fazer como disse Ângela Davis e mudar radicalmente aquilo que não podemos mais aceitar!
(1) https://g1.globo.com/economia/noticia/brancos-sao-maioria-em-empregos-de-elite-e-negros-ocupam-vagas-sem-qualificacao.ghtml
(2) https://g1.globo.com/economia/concursos-e-emprego/noticia/2020/09/24/menos-de-5percent-dos-trabalhadores-negros-tem-cargos-de-gerencia-ou-diretoria-aponta-pesquisa.ghtml
(3) Como referência para este texto, foi utilizado a 10ª edição da obra Quarto de Despejo, publicada em 2014.
(4) https://www.observatoriodaimprensa.com.br/genero-e-inclusao/mulheres-invisiveis-que-resistem
(5) https://www.brasildefato.com.br/2022/06/13/central-do-brasil-mais-de-33-milhoes-de-brasileiros-estao-passando-fome
(6) https://www.cartacapital.com.br/sociedade/no-brasil-63-das-casas-chefiadas-por-mulheres-negras-estao-abaixo-da-linha-da-pobreza/
(7) Categoria cunhada por Moura para definir uma larga camada social sem função definida no capital e que transita entre as superpopulações relativas estagnadas e o completo pauperismo. Essa superpopulação superava amplamente o contingente necessário para um exército industrial de reserva em um capitalismo atrofiado pela dependência. Sobretudo, uma gigantesca massa de desvalidos que tinha em si uma capacidade sem precedentes de baixar os salários dos trabalhadores assalariados brancos, processo fundamental para restituição à burguesia interna do valor perdido no mercado mundial. [VASQUES, 2020, n.p.].
REFERÊNCIAS
ALVES, Daniel Tadeu. A Relação Estrutural Entre Capitalismo E Racismo: O Genocídio Da População Negra Enquanto Projeto Societário. v. 16 n. 1 (2018): Anais do XVI Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço Social disponível em https://periodicos.ufes.br/abepss/article/view/22787. Acesso em 18 de abril de 2022.
CASTRO, Josué de. Fome Como Força Social: Fome E Paz. Revista Pourquoi, número especial, março de 1967, Paris.
FARIAS, Tom. Carolina: Uma biografia. Rio de Janeiro: Malê. 2019
GOMES, Helton Simões. Brancos são maioria em empregos de elite e negros ocupam vagas sem qualificação. Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/noticia/brancos-sao-maioria-em-empregos-de-elite-e-negros-ocupam-vagas-sem-qualificacao.ghtml> Acesso em 08 de abril de 2022
GONZALES, Lélia. Por um feminismo afro-latino-americano. Caderno de Formação Política do Círculo Palmarino, 2011.
IPEA. Estudo mostra desigualdades de gênero e raça no Brasil em 20 anos. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_acymailing&ctrl=archive&task=view&listid=10-> Acesso em 08 de abril de 2022
MAIA, Katy. Et al. O papel das mulheres pobres brasileiras na estrutura familiar monoparental feminina: uma análise do ano 2012. Revista Econômica – Niterói, v.17, n.2, p. 97-122, dezembro 2015
MOURA, Clóvis. Escravismo, colonialismo, imperialismo e racismo. Afro-Ásia, n. 14, p. 124-137, 1983.
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino. Mulheres chefes de família e a vulnerabilidade à pobreza. 2020. Disponível em: https://contee.org.br/mulheres-chefes-de-familia-e-a-vulnerabilidade-a-pobreza/. Acesso em 10 de abril de 2022.
No Brasil, 63% das casas chefiadas por mulheres negras estão abaixo da linha da pobreza. Carta Capital, 2019. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/no-brasil-63-das-casas-chefiadas-por-mulheres-negras-estao-abaixo-da-linha-da-pobreza/ Acesso em 08 de abril de 2022
VASQUES, Tálison. O genocídio como atividade essencial do Estado: Notas sobre a segurança pública do Rio de Janeiro e o lugar social do negro no capitalismo dependente. Boitempo, 2020. Disponível em: < https://blogdaboitempo.com.br/2020/06/15/o-genocidio-como-atividade-essencial-do-estado/ > Acesso em 22 de abril de 2022.
JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. São Paulo: Ática, 2014
JESUS, Carolina Maria de. Casa de Alvenaria, prefácio de Conceição Evaristo e Vera Eunice de Jesus. São Paulo: Companhia das Letras, 2021, vol. 1, Osasco.
JESUS, Carolina Maria de. Casa de Alvenaria, prefácio de Conceição Evaristo e Vera Eunice de Jesus. São Paulo: Companhia das Letras, 2021, vol. 2, Santana.
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Maria Carolina de Oliveira dos Santos é professora de Geografia, mestranda em Geografia pelo Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (PGGEO-UFRRJ) e ex-diretora de Relações Internacionais da União Nacional dos Estudantes (UNE).